Do lado do NÃO

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Obstetra e ginecologista, o Dr. João Paulo Malta recebeu-nos para uma conversa sobre um dos assuntos que mais divide as opiniões dos portugueses: a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez. “Não, Obrigado” é a resposta do médico. Na primeira pessoa, explica-nos porquê.

i-Nova!-Em linhas gerais o que defende a plataforma “Não, Obrigado”?
Doutor João Paulo Malta: A plataforma defende o “não” no re-ferendo por duas razões: primeiro porque estamos contra a libera-lização total do aborto, sem indicação médica; e segundo porque consideramos que está a ser esquecido o direito que as famílias têm de ser ajudadas a manter a gravidez. Pretende ser uma plataforma plural com apoiantes dos mais diversos quadrantes sociais.

i-Nova!-De acordo com o código civil português, o direito à vida só é reconhecido com o nascimento completo do ser. Como encara este estatuto?
Como é sabido, há uma discussão acesa sobre o reconhecimento do direito à vida em termos jurídicos. A nossa Constituição reconhece o direito à vida, e mais, reconhece direitos de herança a embriões e fetos – só se reconhece este tipo de direito a coisas vivas. A vida, do ponto de vista científico, começa no momento da concepção. Sou médico; o debate jurídico, remeto aos juristas.

i-Nova!-Um dos argumentos que constam do manifesto da plataforma é o de que “os impostos não devem servir para financiar clínicas de aborto”. Gostaríamos que nos explicasse esta ideia.
Se há famílias que não têm capacidade para manter uma gravidez, é óbvio que o dinheiro dos nossos impostos tem de servir para ajudar essas famílias. Porque se lhes pagarmos o aborto, o problema continua lá, e é isso que nós não compreendemos. Além do mais, até ao momento, só se candidataram a licenças para clínicas de aborto estruturas privadas, com as quais o ministro da saúde parece disposto a fazer convenções. Ora, o nosso dinheiro não deve financiar negócios privados de aborto.

i-Nova!-Acha que o sistema de segurança social português está preparado para receber as crianças que não são desejadas e que vivem em condições pouco dignas?
O sistema de segurança social português, bem como as instituições que acolhem crianças, fazem o que podem. Estas poderiam fazer muito mais se tivessem o apoio público, que é muito restrito. Apenas 30% dos orçamentos das institui-ções privadas é que vêm do orçamento geral do Estado. Os outros 70% correspondem a donativos particulares e de empresas, e a trabalho voluntário. Se há dinheiro para umas coisas não se percebe por que é que não há para outras.
i-Nova!-O movimento afirma que “o aborto tem efeitos destrutivos na vida das mu-lheres”. Não acha que crianças indesejadas ou nascidas em condições menos dignas terão também es-ses “efeitos destrutivos”?
Como médico, nunca vi uma mulher que, quando vê o seu filho, ainda que indesejado, não o queira consigo. E garanto que existem muitas gravidezes que não são planeadas. Aliás, há até mães que pretendem dar o seu bebe para adopção e depois de o verem nascer, retiram esse pedido. As consequências de um aborto para a vida da mulher, se-gundo a Associação Americana de Psiquiatria, constituem perturbações que permanecem ao longo de décadas. E não tenho dúvida que uma criança, ao nascer, tem consequências muito mais positivas e até estruturantes do que uma que não nasceu.

i-Nova!-O que é que pensa que vai acontecer se o “sim” à despenalização ganhar?
A avaliar pelos dados dos outros países, assistiremos a um aumento do número de abortos. Em quase todos os países, nomeadamente em Espanha, desde a despenalização em 1985, há um aumento do número de abortos, o que demonstra a nossa tese de que o Estado dá um sinal e a população em geral res-ponde. É por isso que é um negócio.

i-Nova!-Este referendo vem na melhor altura? Pensa que a opinião pública e a sociedade não se modificaram desde 1998 até agora?
Penso que o povo se manifestou de forma evidente em 1998 – 8 anos não é muito tempo. No entanto, temos que lidar com o que existe. Neste momento vamos ter um refe-rendo. Acho que em 1998 havia muito pouca gente informada sobre este assunto, que reagia porque o partido político ou credo religioso a que per-tencia dizia para votar “não” ou “sim”, o que é errado. Hoje em dia há mais pessoas esclarecidas dos dois lados. Creio que há cada vez mais pessoas com uma opinião fundamentada simi- lar à da plataforma “Não, obrigada”. E estamos perfeitamente convencidos de que será a maioria de novo.

i-Nova!-No manifesto do movimento afirmam que a campanha é “centrada na mu-lher”. Como concilia isso com o papel do pai na decisão da continuação da gravidez?
Supostamente, as consequências recaem sobre ambos, mas vivemos numa sociedade em que essas decisões competem essencialmente à mulher. Não se vê, seguramente, muitos pais a entrar nas clínicas de aborto, as mulheres vão sozinhas. É a essas mulheres que temos de dirigir a nossa campanha, para que tomem uma decisão informada.

i-Nova!-Sendo o aborto uma realidade, quais seriam os argumentos que utilizaria à conversa com uma mulher que estivesse prestes a abortar?
Os que uso tantas vezes. Primeiro, se a mulher precisa de ajuda, ajudo--a em termos logísticos – consultas, ecografias, etc... Segundo, tento esclarecê-la em termos médicos e saber se quer ver a sua ecografia – a gigantesca maioria das mulheres, depois de ver o seu feto, muda de opinião. Também podemos ajudá-la em termos institucionais, tentando resolver os problemas que estão na base dessa decisão. Aliás uma das nossas propostas é a de que, no caso do “não” vencer, o dinheiro previsto para as convenções pró-aborto seja utilizado para apoiar essas mulheres.

i-Nova!-Disse-nos que não julga as mulheres que fazem um aborto. No entanto, acha que essas mulheres devem ser levadas a tribunal e penalizadas…
A lei em discussão, prevê o julgamento pela prática de aborto a partir das 10 semanas, por isso o julgamento é uma falsa questão. Primeiro, porque em Portugal nunca houve nenhuma mulher presa por fazer um aborto. Eu não julgo moralmente nenhuma mu-lher. No entanto, acho que face à lei actual e futura, o aborto é um crime e, para qualquer crime, há um julgamento. Claro que há circunstâncias atenuantes e agravantes. Agora se acho que todas as mulheres deviam ir para a prisão? Não, de maneira ne-nhuma! As circunstâncias atenuantes têm sido entendidas pelos juízes. Se há circunstâncias em que uma mu-lher devia ir para a prisão? Acho que sim! Pode haver circunstâncias agravantes que levem a essa situação.
Acho é que se o “não” ganhasse e o Ministério da Saúde aceitasse o repto que lhe fizemos de desviar para o auxilio às famílias o dinheiro que ia ser utilizado para as clínicas de aborto espanholas, isso sim, seria um enorme contributo para que o número de abortos diminuísse significativamente.

*Ana Sofia Eustáquio
*Renato Duarte
*Mafalda Ramos

1 comentário:

Anónimo disse...

q aconteceu à secção de desporto, caríssimos? evaporou-se?